Eleições na Bolívia.
Guinada à direita é certa.

Dois candidatos à direita disputam 2º turno.
A Bolívia realiza hoje o primeiro segundo turno presidencial de sua história com um duelo fora do eixo que marcou a política do país por 20 anos: no lugar do MAS (de Evo Morales e Luis Arce), disputam o poder dois adversários à direita do espectro — o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga (Aliança Libre) e o senador Rodrigo Paz (PDC). Ambos prometem atacar a crise de inflação, falta de dólares e escassez de combustíveis, mas divergem no ritmo e na dosagem das mudanças.
A eleição consolida a virada do MAS e abre uma disputa sobre como reordenar a economia: fala-se em rever o câmbio fixo, recalibrar subsídios aos combustíveis, atrair investimento externo e destravar o lítio — item-chave para a transição energética e para as contas do país. Observadores internacionais acompanham a votação; pesquisas indicam disputa apertada.
Rodrigo Paz: “capitalismo para todos”, descentralização e reforma gradual
Senador e filho do ex-presidente Jaime Paz Zamora, Rodrigo Paz surpreendeu ao liderar o 1º turno e consolidou-se como um nome de centro-direita com discurso de reconciliação e anticorrupção.
Paz propõe reformas graduais que preservem redes de proteção social, buscando estabilizar preços e normalizar o mercado de dólares sem choque. Suas bandeiras incluem a descentralização orçamentária (“Agenda 50/50”) e a ideia de “capitalismo para todos”, com formalização do setor informal. Defende injetar cerca de US$ 4 bilhões na economia por meio de novos financiamentos e investimento, condicionando a expansão ao equilíbrio fiscal.
Lítio e geopolítica — Paz sinaliza abrir o setor ao capital privado sem abandonar o papel do Estado e navegar um realinhamento externo que reaproxime os EUA, mas sem rupturas bruscas com acordos vigentes. (Leitura a partir dos seus acenos pró-investimento e moderação no ritmo das reformas.)
A cautela pode frustrar expectativas diante de uma crise aguda; além disso, um Congresso fragmentado exigirá coalizões para aprovar mudanças estruturais.
Jorge “Tuto” Quiroga: choque liberal, cortes de subsídios e nova diplomacia econômica
Presidente entre 2001–2002, Quiroga volta com um programa assumidamente pró-mercado e promessa de “mudança dramática” para estancar a inflação e recompor reservas.
Propõe um ajuste rápido: cortar gastos, reduzir subsídios aos combustíveis, privatizar ou fechar estatais deficitárias e enxugar ministérios. Fala ainda em mútuo cidadão (dar participação de ativos/receitas aos bolivianos) e reformas regulatórias para atrair capital. É plataforma mais próxima de receitas do FMI.
Lítio e geopolítica — Quiroga promete rever ou cancelar contratos assinados com China e Rússia no lítio, promover licitações competitivas, criar zonas francas para a cadeia de baterias e coordenar com Chile e Argentina. Quer reaproximação forte com os EUA.
O choque pode ter custo social e político no curto prazo (subsídios e tarifas), além de encontrar resistência de segmentos indígenas e de esquerda. Como não há maioria parlamentar definida, governabilidade dependerá de acordos.
O que muda em relação ao MAS
Ambos os finalistas indicam revisão de pilares do modelo do MAS: fim gradual do câmbio travado, realinhamento internacional (menos dependência de China/Rússia, mais laços com os EUA) e abertura para investimento privado — sobretudo no lítio, onde a produção ficou aquém do potencial. A diferença central está no tempo e na intensidade das medidas.
A Bolívia já vive uma mudança de rumo; a escolha neste 2º turno é menos “se” e mais “como” mudar — Paz promete gradualismo com redes de proteção; Quiroga, choque liberal para “virar a página” da crise. O impacto imediato recairá sobre câmbio, subsídios e lítio, com reflexos na geopolítica e na vida cotidiana.
