Entre amor, ódio e dependência: o Brasil que não sabe viver sem Bolsonaro | DMA Notícias

Mesmo preso e fora do jogo político, Bolsonaro continua sendo o eixo em torno do qual mídia, influenciadores, artistas e adversários orbitam — e sua ausência expõe a dependência de todos eles.

Foto: Agência Brasil

Entre elogios apaixonados e ataques obsessivos, há uma verdade inescapável no Brasil de hoje: há mais de oito anos, uma parte expressiva do debate público — da política ao entretenimento, passando pela mídia e pelo mundo digital — vive, cresce e até sobrevive a partir de um único nome: Jair Messias Bolsonaro.

Para seus apoiadores, Bolsonaro é mais do que um ex-presidente: é referência moral, símbolo de resistência e, para muitos, um divisor de águas na política brasileira. Chamado de “Mito”, é visto como alguém que rompeu um sistema viciado que alternava o poder entre grupos que se diziam adversários, mas se moviam dentro da mesma lógica de interesses. A devoção é real, orgânica e segue intacta, mesmo após sua saída do Palácio do Planalto.

No extremo oposto, encontra-se um conjunto variado de atores para quem Bolsonaro é igualmente indispensável — mas por outra razão: ele é fonte contínua de cliques, curtidas, manchetes e votos.
Da mídia tradicional a influenciadores digitais, passando por artistas e parlamentares do campo adversário, Bolsonaro virou um tipo de “ativo” permanente. Criticá-lo rende repercussão automática. Usar sua imagem, mesmo que distorcida, garante visibilidade.
É o fenômeno do “anti-Bolsonaro” como marca — tão rentável quanto o próprio bolsonarismo.

A mídia hegemônica é um exemplo claro disso. Por motivos diversos — ideológicos, comerciais ou meramente estratégicos — Bolsonaro ocupa diariamente espaço nobre. A regra básica é simples: ele dá audiência. E, no jornalismo contemporâneo, audiência é a variável que movimenta redações, relevância e faturamento.

O mesmo vale para parte do meio artístico. Muitos dos artistas mais vocalizados politicamente construíram barreiras sólidas com o bolsonarismo, mas, ao mesmo tempo, prolongaram sua relevância pública apoiando-se no antagonismo direto ao ex-presidente, especialmente durante o período de mudanças na Lei Rouanet — mudanças essas que deslocaram recursos para projetos menores e artistas iniciantes, contrariando interesses consolidados há décadas.

Na política institucional, o fenômeno é ainda mais evidente. Deputados e senadores opositores ao bolsonarismo — muitos irrelevantes antes de 2018 — hoje acumulam seguidores, curtidas e engajamento sempre que mencionam Bolsonaro, ainda que para atribuir a ele qualquer problema do país, seja ele responsável ou não.
Memes, ironias, deboches, distorções: tudo funciona. A narrativa precisa continuar viva, porque depende dela a permanência desses atores no palco político.

Os influenciadores digitais seguem a mesma lógica. Num ambiente em que a disputa por atenção é brutal, Bolsonaro se tornou uma das palavras-chave mais valiosas da internet brasileira. Conteúdos que citam seu nome — mesmo superficialmente — geram engajamento muito superior ao de temas comuns. Assim, ele virou um motor para páginas de opinião, perfis de sátira, analistas políticos, youtubers, podcasters, comentaristas — e até perfis anônimos.

E não se pode excluir o próprio governo federal. Já no terceiro ano de mandato, o atual presidente ainda dedica parte significativa de seus discursos, entrevistas e posicionamentos à figura de Bolsonaro. A estratégia — incomum pela duração — funciona como cortina de fumaça: ao repetir problemas herdados e relembrar o adversário, o governo desloca a atenção das dificuldades presentes.
Trata-se de uma tática política evidente: manter Bolsonaro vivo no discurso para minimizar desgastes próprios.

E agora surge a pergunta que inquieta parte significativa do cenário político: se Bolsonaro está preso e temporariamente fora do jogo, como sobreviverão todos esses atores que dependem de sua presença, seja para apoiar, combater, lucrar ou gerar engajamento?
O que fará a imprensa sem seu antagonista preferido?
Do que viverão os perfis nas redes que produzem conteúdo diário baseado nele?
Qual será a matéria-prima dos discursos de opositores que construíram carreiras inteiras atacando Bolsonaro?
Como se manterão relevantes os influenciadores que transformaram seu nome em moeda digital?
E como irá se posicionar o governo, que por três anos utilizou o ex-presidente como justificativa para tudo?

Se há algo que Bolsonaro demonstrou é que sua presença — física, eleitoral ou simbólica — reorganizou a política nacional de uma forma que ninguém pode mais ignorar. E é justamente por isso que sua ausência repentina cria um vácuo incômodo para quem dependeu dele, seja por identificação ou conveniência.

A grande questão permanece aberta:
Sem Bolsonaro no centro do debate, quem sobreviverá politicamente?
E quem desaparecerá junto com a narrativa que o manteve em evidência?

Se alguém tiver a resposta, gostaríamos imensamente de saber.

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